Entrevista com Dani Parejo: “Vejo-me a jogar durante muitos mais anos”.

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O jogador do Villarreal recebeu o prémio FutbolJobs pela sua “Carreira Desportiva”.

– O que sabes sobre o projeto FutbolJobs?

É uma plataforma muito interessante, dedicada a tudo o que envolve o futebol. Não é só para os jogadores de futebol, mas também para as pessoas que podem trabalhar, por exemplo, no estádio, na bilheteira… É uma ferramenta importante para as pessoas do futebol e dá-lhes acesso ao mundo do futebol, seja a nível profissional ou a uma escala mais pequena, para que possam desfrutar dele.

– Como te sentes por teres recebido o prémio “Lifetime Achievement Award” da FutbolJobs?

Estou muito feliz, orgulhoso e agradecido. Todos os prémios, a nível pessoal, são importantes. É um prémio que não é só meu, mas de todas as pessoas que me ajudaram ao longo da minha carreira: colegas de equipa, treinadores, técnicos, fisioterapeutas, médicos, pessoas dos vários clubes por onde passei e que me permitiram chegar a este número de jogos.

– Fizeste mais de 500 jogos na Liga, mais de 750 em todas as competições, incluindo as selecções nacionais. E estás na lista com Xavi, com Casillas, com Griezmann, com Messi, em breve…

É uma honra chegar a este número de jogos, não é nada fácil, mas também significa que as coisas me correram bem, graças a Deus as lesões respeitaram-me, tive a oportunidade de jogar muito, de desfrutar muito, de competir e de estar com estes nomes, com o que eles têm sido no mundo do futebol, não a nível nacional mas a nível mundial… estar perto deles e poder chegar a alguns… Quando era miúdo não o imaginava, mas graças ao trabalho de muita gente e a mim próprio, pude ou estou a realizar um sonho e já fiz muitos jogos.

– Se te dissessem, quando jogavas em Coslada, nos campos de terra batida, que ias chegar a estas alturas aos 35 anos, o que terias pensado?

Bem, não o teria imaginado por nada deste mundo. Já é difícil chegar lá, é difícil jogar a um nível elevado, mas acho que é ainda mais difícil manteres-te lá. E ainda mais porque o futebol mudou…. Antigamente o futebol era de uma maneira, agora é de outra, tens de te adaptar, tens de evoluir e graças ao trabalho árduo consegui chegar a este número e espero conseguir muitos mais.

– Depois foste para a Fábrica, para as camadas jovens do Madrid. Di Stéfano disse de ti que eras a pérola da formação. Achas que o que ele disse pesou em ti quando passaste para a equipa principal, que as pessoas olharam para ti de uma forma diferente?

Não, é verdade que uma pessoa como o Alfredo, que descanse em paz, ter dito isso de mim foi um elogio. É verdade que talvez também tenhas uma posição de responsabilidade, de ter de provar que o que o Alfredo disse não estava enganado. Eu sou um tipo muito normal, muito simples, encaro tudo com muita naturalidade, tento gerir as coisas com normalidade e acho que continuei a jogar o futebol que costumo jogar, a forma como entendo o futebol, a forma como gosto dele e porque para mim foi isso que me fez ser quem sou, fazer a minha carreira, que podia ter sido melhor, também podia ter sido pior, mas pronto, estou muito orgulhoso da carreira que tenho tido no mundo do futebol até agora e para mim é graças à minha forma de jogar, porque nunca mudei.

-Jogaste 14 jogos no Real Madrid, ainda tens algum problema se tivesses jogado mais tempo?

No final, é muito difícil jogar no Madrid, é muito complicado. Trazem sempre jogadores muito bons, costumam trazer os melhores jogadores do mundo em quase todas as posições. Espinita? Bem, sim, gostaria pelo menos de ter tido a oportunidade ou a continuidade de jogar pelo menos seis, sete jogos, o que sei que é complicado. Penso que num só jogo, jogando durante algum tempo, é difícil mostrares o teu potencial. É verdade que gostaria de ter tido pelo menos a oportunidade de ver se podia ou não jogar no Real Madrid durante mais anos.

– De lá foste para o Getafe. Aí dás o salto e vês que vais ser jogador da Primeira Divisão durante muitos anos…

Sim, cheguei ao Getafe e é verdade que o clube nessa altura era muito diferente do que é agora. Penso que o Getafe apostava mais em jovens, em pessoas que estavam no mundo profissional há pouco tempo, mas que estavam no topo. Como no meu caso, também houve cinco ou seis casos de jogadores do Real Madrid que foram para o Getafe. Eu apostava em jovens, em pessoas que tinham projeção e dava-lhes a oportunidade de jogar na Primeira Divisão e de se desenvolverem. E estive lá dois anos muito bons: no primeiro ano ficámos em quinto ou sexto, fizemos a Liga Europa. Até ele chegar há alguns anos, foi a melhor classificação do Getafe na sua história e também vivi na minha casa, em Madrid, em Coslada, o treino era muito perto de mim… Era muito confortável para mim e foi uma experiência sensacional. Foi muito bom para mim treinar e dar o salto para uma grande equipa como o Valência.

– E foi aí que o Valência te contratou, onde és titular há muitos anos, mas no início foi difícil, não foi?

É difícil. Eu era ainda muito jovem, era um miúdo, tinha estado dois anos na Primeira Divisão num clube que, no sentido da grandeza, obviamente não se compara ao Valência… em termos de clube, de instituição e de história. Portanto, vim para um clube, para uma cidade impressionante como o Valência, um clube como o Valência, a massa social que tem, o que é como clube… O Valência ficou praticamente todos os anos em terceiro lugar, atrás do Madrid e do Barcelona. As exigências eram muito elevadas, jogava na Liga dos Campeões e jogava com jogadores muito bons. No início foi difícil, foi difícil mudar, deixar a minha casa, a minha família, os meus amigos para um sítio novo… foi praticamente a primeira vez que saí de casa sozinho, sem a minha família… é sempre difícil. Mas bem, sempre fui muito bem tratado lá, cresci lá, praticamente formei-me a nível profissional no Valência. A minha carreira profissional foi feita no Valência durante nove anos. Vivi momentos muito duros, momentos muito difíceis, mas também vivi momentos espectaculares, únicos, que guardo para mim, que estarão sempre dentro de mim. Passei nove anos espectaculares no Valência, aprendi muito e diverti-me muito.

Nove épocas, no top-10 dos jogadores com mais jogos disputados, ídolo, capitão… e tens de sair de uma forma que gostarias de ter saído de outra maneira…

Bem, sim, as circunstâncias surgiram, o clube disse-me que não me queria, que não queria que eu continuasse. Tinha mais dois anos de contrato e falámos com o clube. É óbvio que se não te querem onde estás e querem que saias, é difícil estar à vontade, estar feliz, apesar de… não só os adeptos ou na rua, é impressionante como as pessoas gostam de mim… No final, os meus companheiros de equipa que tive, as pessoas do clube… senti o carinho de todos, a questão é que o futebol é muitas vezes assim, há circunstâncias que não dependem de ti, que tens de enfrentar da melhor maneira possível e eu tentei fazer o meu melhor. Gostaria, é verdade, que na altura tivesse gostado de ficar muito mais tempo no Valência, obviamente pelo que vivi e porque foi para mim uma experiência e algumas experiências impressionantes que ficarão para sempre comigo? Mas bem, acho que lidei com isso da melhor maneira, gostaria de me ter despedido de outra forma também, não consegui, mas bem, no final o que me resta é que ando na rua, vivo em Valência, e todas as pessoas me adoram, falam muito bem de mim e no final acho que é isso que tu realmente valorizas nas pessoas. O que te resta, a forma como as pessoas te mostram isso, como te mostram isso, e para mim isso é o mais importante.

– Nas mãos de quem está Valência?

Há vários anos que o Valência se encontra numa situação difícil, não só este ano, mas também a nível desportivo. Quando percebo que a gestão não é boa, mais cedo ou mais tarde isso acaba por se refletir no plano desportivo. A nível desportivo, o Valência, para o clube que é, para a massa social que tem, para a importância que tem a nível nacional e mundial, para estar na situação em que está, é difícil de ver e ainda mais quando já lá estiveste e viveste o que viveste. Parece que situações como esta nunca vão acontecer, mas muitas vezes o futebol, ou a vida, quando deixas de lado o que amas, acaba por te castigar. Na realidade já lá vão vários anos, a nível desportivo …. acho que para mim o Valência, ou o que eu considero o Valência pelo que vivi, tem de lutar todos os anos no mínimo pelas competições europeias. Haverá anos em que não conseguirá qualificar-se, mas pelo menos lutará pelas competições europeias, não apenas para evitar a despromoção. Compreendo que os valencianos, que conheço bem e tenho muitos amigos, estejam a passar por momentos muito difíceis, mas penso que, no fim de contas, quando a gestão não é boa, acaba por ter consequências.

– Acabas no Valência e o Villarreal abre-te as portas. No teu primeiro ano, ganhas a Liga Europa, o teu segundo título depois da Taça com o Valência…

Sim, chegou o momento em que me disseram que eu não estava interessado e então falei com o meu agente e tentámos ir para o melhor lugar possível ou para onde eu achasse que seria melhor para mim. Por isso, antes de falar de qualquer coisa, é verdade que foi um momento muito difícil, muito duro para mim, para a minha família, sair de Valência da forma como saí e também queria espairecer um pouco. Depois, surgiu a oportunidade no Villarreal, falei com o Unai, que era o treinador do Villarreal, e ele disse-me que estava interessado em que eu voltasse, que assinasse pelo Villarreal, ligou-me, falei com ele: “Dani, olha, tenho esta possibilidade, gostava que viesses jogar e tal”. Não pensei nisso, primeiro porque falei com o Unai, conhecia o Unai, sei a sua carreira, sei o treinador que é e depois porque acho que o Villarreal, todos os anos que estive no Getafe, no Valência… sempre teve uma entidade muito clara, como querem o perfil dos jogadores, como querem que as suas equipas joguem e achei que as minhas condições, as minhas caraterísticas como futebolista, eram ideais para um clube como o Villarreal. Pela forma como jogam, porque querem tomar a iniciativa, querem controlar o jogo, querem ser protagonistas, lutam sempre por objectivos interessantes: entrar na Europa ou mesmo na Liga dos Campeões. É uma equipa ambiciosa, não mudei de casa, continuo a viver em casa, os meus filhos continuam com os amigos na mesma escola, a minha família, a minha mulher é muito feliz em Valência, estamos aqui há muitos anos e praticamente a minha vida não mudou… Só mudei porque tive de vir treinar para Vila-real. Mas bem, quando chegas aqui e vês a família Roig, o Fernando sénior, o Fernando júnior, o Llaneza, que descanse em paz, ainda era vivo na altura. Todas as pessoas do clube, os serviços que o futebolista tem para estar ao seu melhor nível. Penso que, para além de clubes como o Madrid, o Barça, o Atlético de Madrid… que penso que são um nível diferente de clube, a nível mundial, em termos de massa social e de “megaclubes” que são… O Villarreal acho que é um grande exemplo de como se gere um clube, como se dá carinho não só à equipa principal… vens aqui num sábado à tarde ver as equipas jovens, os cadetes e está lá o Fernando Sr., o Fernando Jr., o Llaneza, o Miguel Tena… acho que isso lhes dá um carinho especial, tratam as pessoas de uma forma especial. Obviamente que são os donos que fazem e desfazem as coisas, porque é deles. Mas bem, quando demonstram carinho, fazem as coisas com carinho, com paixão? Então é verdade que se a bola não entra aqui tens um problema, não é? Mas não é por acaso que nos anos em que estão no clube, não sei se são 23 ou 24 anos, jogaram não sei se na Europa 18, 19 ou 20 vezes. Não sei exatamente, mas é uma quantidade enorme. E no final acho que quando fazes as coisas com amor, como eles fazem, quase sempre, nem sempre porque a vida é assim muitas vezes, mas quase sempre compensa.

– Chegaste com 31 anos. Muitos disseram que te ias reformar, mas tens 35 anos e estás a jogar por tudo?

Estou muito contente. Graças a Deus, as lesões têm sido boas para mim, tenho jogado muito e tenho-me divertido muito. Para mim, 31 anos ainda é muito jovem. É verdade que antigamente as pessoas se reformavam aos 31 ou 32 anos, mas agora, graças a toda a questão da recuperação, do descanso, da alimentação… Penso que há muito mais ferramentas nesse sentido para que o futebolista seja muito mais optimizado do que há anos. É óbvio que tudo evoluiu muito. Agora tenho 35 anos e gosto tanto do futebol como quando tinha 18. Bem, agora gosto mais porque compreendo muito melhor o jogo e porque muitas vezes é quando compreendes o jogo que gostas dele, quando fazes as coisas acontecerem, quando antecipas algo que sabes que vai acontecer? Quando se trata de compreender o futebol, como tudo na vida, é quando realmente gostas dele. Portanto, tenho 35 anos, joguei muitos jogos todos os anos e estou a gostar muito. Ainda tenho um ano de contrato, este ano e mais um, mas neste momento é verdade que não sei o que vai acontecer no futuro, mas estou muito feliz, muito confortável, e hoje vejo-me a jogar durante muitos mais anos.

– Quanto tempo dura Dani Parejo?

Para te dizer a verdade, não sei, porque me sinto muito bem, estou muito confortável, estou a divertir-me muito e posso dizer-te que não sei…. Vamos ver se consigo jogar mais três ou quatro anos. Não sei, talvez no próximo ano te diga que vejo que este vai ser o meu último ano por alguma circunstância ou outra, não sei, mas hoje vejo-me a jogar muitos mais anos.

– Já pensaste no que vais fazer quando deixares de jogar? Gostavas de ser treinador?

Estou a fazer um curso de coaching, gostava de me formar. Estou a treinar, estou a fazer o meu estágio… para aprender, para fazer coisas… Estou a tirar o curso de treinador B, este ano, para o ano vou tirar o A. Para o ter, é verdade que gostava de treinar, é uma coisa que tenho aí. Sempre disse que antes de ser treinador gostaria de treinar, não gostaria de terminar e no ano seguinte entrar numa equipa como treinador e trabalhar…. Gostaria de trabalhar com uma equipa técnica adjunta que entendesse um pouco o futebol como eu o vejo e poder viver o dia a dia com eles, aprender a preparar vídeos, a preparar conferências de imprensa, a lidar com diferentes situações ou problemas num balneário… Não é a mesma coisa, por exemplo, no meu caso agora, como se eu fosse o treinador a tentar tomar uma série de decisões. Gostaria de ter uma boa formação e, se tivesse uma boa formação, gostaria de tentar ser treinador, sim.